Quarta-feira, 25 de Fevereiro de 2009

A Arte Medieval - Arte Românica

 

 

A arte românica surgiu em plena época feudal, tendo-se desenvolvido entre os sécs. XI e finais do séc. XII, transformando-se numa arte amadurecida e estruturalmente flexível, que se espalhou por toda a Europa, tornando-se no primeiro estilo internacional da Idade Média. Nesta época, toda a civilização europeia se moveu em nome de uma renovação arquitectónica que foi a expressão mais pura da Fé.

A religião, o temor religioso e o medo do Juízo Final, movimentaram os fiéis nas peregrinações aos principais lugares santos. Os mosteiros e as igrejas que eram centros difusores da religiosidade da época, tinham uma maior importância quando possuíam relíquias de santos, tornando-se, eles mesmos, locais de peregrinação.

As peregrinações e as cruzadas, feitas por populares e nobres, contribuíram em grande parte para a internacionalização da arte do Oriente e do Românico.

O sistema político feudal e a religião foram os dois pólos dinamizadores da arte na sociedade medieval. A arte serviu a majestade do poder temporal e religioso, sendo feita para honorificar ambos.

 

 

 

 

ARQUITECTURA

 

- A arquitectura românica recebeu influências da Antiguidade pagã, do Oriente (nomeadamente da arte bizantina) e dos povos bárbaros e da Irlanda;

- Dividiu-se em dois tipos:

 

» Arquitectura civil e militar

 

- O castelo: Para além do sentido religioso aplicado nas artes em geral, a época necessitou também de uma arquitectura com características defensivas. Nesse sentido surgiu a torre (habitação do senhor ou do nobre), situada numa elevação natural ou artificial, para uma maior segurança; ao seu redor era construída, em terra ou madeira, uma paliçada e um fosso com água, que defendiam a torre, as casas dos populares, os estábulos e os celeiros. A partir do séc. XI, devido a novas tácticas de defesa e armamento, as torres passaram a ser construídas em pedra. Apresentavam um aspecto fortificado e austero, com paredes grossas e altas; tinham forma quadrangular, reforçada por contrafortes salientes, e uma planta muito simples (duas ou três divisões unidas, sem espaços de ligação). As mais complexas possuíam no piso inferior um átrio com uma loja ou oficina; no segundo piso uma sala, a aula, que servia, por vezes, como local de reuniões de família, e a capella (oratório); no terceiro piso situavam-se os aposentos. A entrada da torre era bastante peculiar pois o acesso era feito directamente para o primeiro piso, através de uma escada em madeira que era retirada em momentos de perigo.

 

Torre de D. Urraca, Espanha, séc. X

 

 

Devido ao contacto com o Oriente das cruzadas, as torres evoluíram no sentido do castelo, que apresentava todas as características da torre, mas ocupava um maior espaço e continha mais elementos arquitectónicos como: uma dupla muralha com paredes compactas, terminada em ameias (aberturas no parapeito da muralha que serviam para os defensores avistarem os inimigos), rodeada pelo adarve ou caminho da ronda com baluartes com seteiras (aberturas na muralha para, como o nome indica, se lançarem setas ou flechas) nas guaritas, fosso (escavação profunda e regular, destinada a dificultar e, principalmente, impedir o acesso do inimigo  e, desde o séc. XII, por cima das entradas, mata-cães; possuíam uma torre de menagem, que permitia a segurança do castelo; o pátio exterior; a capela; as cisternas; as casas das guarnições e dos cavaleiros; as cavalariças e os armazéns;

 

Torre de menagem do Castelo de Monsaraz, Portugal

 

Castelo de Peyrepertuse, França

 

 

 

» Arquitectura religiosa

 

- Na formação desta tipologia tiveram grande importância os ensinamentos das ordens religiosas de Cluny (a partir de 984) e de Cister (a partir de 1100): o estilo cluniacense, de ornamentação profusa e muito luxuosa, com pinturas murais e esculturas decorativas, contrastava, sem dúvida, com a grande sobriedade cisterciense, cujas construções possuíam paredes nuas, quase sem elementos decorativos;

- A Europa Medieval, como afirmou Raoul Glaber, "cobriu-se com um manto branco de igrejas", todas elas unidas pela mesma fé e pelos mesmos princípios, mas com uma grande diversidade formal, com particularidades próprias de cada região. Foi esta diversidade na unidade que mais caracterizou o Românico;

- A catedral (também denominada por igreja, na linguagem comum): Definida a partir do século XI, apresenta como novidade em relação às anteriores o facto de ser totalmente abobadada em pedra, substituindo os tectos em madeira: a nave principal era coberta por abóbadas de berço ou canhão, que em alguns casos eram substituídas por cúpulas e as naves laterais eram cobertas por abóbadas de aresta (cruzamento na perpendicular de duas abóbadas de berço, da mesma dimensão e ao mesmo nível);

 

Interior da Catedral de Durham, Inglaterra: salientam-se as abóbadas de aresta e as grossas colunas

 

 

- Articulação em planta da catedral românica: As igrejas românicas seguem dois modelos: o menos utilizado, de planta centrada, em cruz grega, hexagonal, octogonal ou circular, de influência oriental; e o dominante, de tipo basilical, em cruz latina, com três, cinco ou sete naves. As naves da catedral são atravessadas por uma outra, o transepto, que podia ter apenas uma nave ou ser tripartido como o corpo da igreja e que confere ao edifício a sua forma cruciforme; no ponto de cruzamento aparece o cruzeiro, encimado pelo zimbório ou torre lanterna (sistema de iluminação e arejamento da igreja); no lado nascente do transepto abrem-se um ou dois absidíolos, que por vezes eram colocados no alinhamento das naves laterais; a nave central conduz à abside central, que contém a capela-mor onde se situa o altar e o coro. Devido ao aumento do culto, foi necessário construir mais altares onde se celebravam vários ofícios ao mesmo tempo; para tal, foi construído o deambulatório (espécie de corredor ou nave curvilínea), que contorna a abside e geralmente possui três a cinco capelas radiantes (que serviam para instalar os altares secundários). Este em conjunto com a abside forma a cabeceira. As igrejas de peregrinação possuíam uma cripta, local onde se depositavam e veneravam os restos mortais e/ou as relíquias dos santos e onde se realizavam cerimónias religiosas; em alguns casos a igreja românica é precedida por um nártex, que serve de vestíbulo à igreja (influência da basílica cristã); destinava-se a abrigar os catecúmenos (não baptizados), os energúmenos (possuídos dos demónio) e os penitentes; ou por um átrio, um recinto aberto, espécie de pátio quadrangular rodeado por quatro alas abobadadas e colunadas. Consoante as regiões, a catedral podia ter uma ou duas torres sineiras, que ladeavam a fachada principal e possuíam diversas aberturas que difundiam a luz para a nave principal;

 


Igreja de Saint Gilles-du-Gard, França

 

 

- Alçado interno da catedral românica (desenho do edifício projectado num plano vertical, perpendicular à base): As igrejas são constituídas pela arcada principal, que divide a nave central das laterais e é formada por pilares ou colunas; pela tribuna, uma espécie de galeria semiabobadada, aberta para a nave central, que se destinava às mulheres que iam sozinhas à igreja, pois daí se assistia aos ofícios religiosos; pelo trifório, formado por arcos e que, por vezes, substituía a tribuna e interligava o pequeno corredor situado acima da nave lateral à nave principal (na inexistência desse corredor, o trifório era apenas uma arcatura decorativa cega); e pelo clerestório, a zona de iluminação da igreja que fica pegado aos arcos do tecto, constituído por janelas ou frestas;

 

Catedral de Malmesbury, Inglaterra: na imagem pode-se ver a arcada principal (nível inferior), o trifório (nível intemédio) e o clerestório (nível superior)

 

 

- Devido ao equilíbrio de forças necessário à sustentação das abóbadas, as paredes da catedral românica são grossas, compactas e com poucas aberturas. Isto confere aos interiores, um clima místico de paz e recolhimento, propício à reflexão e à oração;

 

Igreja de Notre-Dame du Port, França, séc. XI

 

Igreja de Notre-Dame-la-Grande, França, 1143

 

Igreja de Santa Madalena de Vézelay, França, 1120

 

Catedral de Modena, Itália

 

Abadia de Santa Maria Laach, Alemanha, séc. XI

 

Basílica de Saint-Sernin de Toulouse, França, séc. XI: vista da abside e da torre-lanterna, sobre o cruzeiro

 

Basílica de Saint-Foy, França

 

 

Vista exterior da abside principal da Basílica de Santa Giulia, Itália, séc. XII

 

 

- O efeito geral da catedral românica é de grande solidez e robustez, reforçado pelos contrafortes salientes e chafrados ou adossados, situados exteriormente no mesmo alinhamentos dos pilares ou colunas que serviam para sustentar as abóbadas ou as cúpulas utilizadas na cobertura; outra das principais características da igreja românica é a horizontalidade;

 

Igreja de S. Pedro de Vilanova de Dozón, Espanha

 

 

- A decoração esculpida das igrejas românicas possui influências bárbaras e bizantinas. Os relevos, ornamentais, figurativos e sobretudo didácticos, distruibuem-se interna e externamente. No exterior do edifício, a decoração escultórica  estava limitada ao portal e à cornija: as cornijas (remate logo a seguir ao telhado) eram decoradas com arcos cegos e cachorradas (conjunto de cachorros, isto é, peças salientes esculpidas), que podiam ter também uma função de suporte da cornija. Os cachorros possuíam formas geométricas, zoomórficas e antropomórficas (as últimas exerciam uma função de educação moral, cívica e religiosa, ou de crítica social e política); a fechar os algeroses (caleiras) existiam gárgulas, que serviam para escoar a água da chuva e podiam ter tanto uma forma simples como serem aproveitadas para a representação de motivos animalistas e míticos;

 

Gárgulas da Igreja de Saint-Foy, França

 

 

Na fachada principal da catedral os elementos decorativos que mais se destacam são as rosáceas (além de decorarem o exterior do edifício, também iluminavam o interior), trabalhadas com motivos geométricos e florais; os grandes janelões (que possuíam as mesmas funções da rosácea); e o portal, que tanto podia ser simples como encaixado num pórtico saliente. O mais vulgar possui: uma entrada chanfrada, ou ombreira, ornamentada com colunelos; uma porta simples ou dupla, que tem a meio do vão uma coluna, também esculpida (mainel), que sustenta a arquitrave (lintel ou dintel), decorada com um relevo esculpido; e um tímpano, espaço semicircular circundado por arcos de volta inteira (arquivoltas), sustentado pelo lintel;

 

Rosácea da Catedral de Durham, Inglaterra

 

Portal da Catedral de Saint Lazare, França: detalhe do tímpano (fig. 2), do mainel e do lintel (fig. 3)

 

Tímpano do portal da catedral de Santiago de Compostela, Espanha

   

Decoração do lintel da Catedral de Santo André, França

 

Portal da Igreja de S. Jorge, Hungria

 

 

- O mosteiro: À sombra destes viveram monges (como os das ordens de Cluny e de Cister) ou monges cavaleiros (como os Hospitalários e Templários), que foram inicialmente os detentores do saber. Coube quase por inteiro aos mosteiros a difusão do estilo românico, visto que eram os mais importantes núcleos culturais  e artísticos deste período. Seguido o ideal ascético da fuga mundi, os mosteiros eram quase todos instalados em zonas isoladas, no alto das montanhas ou em vales e clareiras das florestas, embora alguns existissem no seio das cidades. Eram uma espécie de pequenos mundos autónomos e auto-suficientes, virados para o seu interior e fechados ao exterior por muralhas e portas; foram edifícios de grande complexidade que correspondiam a uma tipologia arquitectónica ditada pelas ordens religiosas. Era constituído por várias dependências necessárias à vida comunitária e à oração - igreja, sacristia, sala capitular, scriptorium, dormitórios, etc. -, distribuídas em três alas arquitectónicas, dispostas ao redor de um espaço quadrangular aberto (o jardim) e rodeado por galerias com arcos de volta inteira apoiados em colunas - o claustro - que ficava adossado ao lado sul da igreja, que o encerrava no fim e era o centro organizador do mosteiro. Possuía uma cuidada decoração escultórica, rica em contrastes de luz e sombra, o que dava ao local uma sensação de paz e recolhimento. Cada uma das alas do mosteiro tinha uma função específica: a que era perpendicular à igreja era chamada de ala dos monges pois continha a sacristia, a sala capitular, as "oficinas" e a escadaria que dava acesso ao dormitório, que ficava por cima destas dependências; na ala oposta à igreja, perpendicular à anterior, situava-se o refeitório, ladeado pelas cozinhas e despensas, o armazém e, por vezes, uma hospedaria; e a ala colada à igreja continha o mandatum, onde se lavavam os pés aos monges acolhidos como hóspedes na comunidade. Técnica e construtivamente, estes edifícios utilizaram as descobertas e invenções obtidas na tipologia anterior, apresentando praticamente todas as suas caracteristicas.

 

Mosteiro de Santa Maria de Armenteira, Espanha

 

Ruínas do Mosteiro de Fountains, Inglaterra



 Abadia cisterciense de Fontfroide, França, séc. XI

 

Mosteiro de San Cugat, Barcelona, Espanha

 

 

Publicado Por Cíntia Pontes às 22:21
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